Pesquisa mostra população brasileira contrária a intervenções no STF
Araras, Lagoa do Sino, Sorocaba, São Carlos
Índice de Confiança na Justiça é produzido desde 2009, com participação de FGV e UFSCar
Críticas contundentes do atual Presidente da República ao Supremo Tribunal Federal (STF) não são novidade, mas a escalada de tensão entre os poderes atingiu dimensões inéditas na história de democracia brasileira nas últimas semanas. Às vésperas de 7 de setembro, é concreto o temor de invasão do Supremo por manifestantes em apoio a Jair Bolsonaro, possivelmente armados, estando inclusive sendo preparado um esquema especial de segurança. No entanto, para a maior parte da população brasileira, não é justificável o fechamento do STF para que o Presidente possa governar ou seria desejável esse fechamento mesmo no caso de a corte decidir sistematicamente contra os anseios da população.
É o que indica a edição mais recente do Índice de Confiança na Justiça no Brasil (ICJBrasil), pesquisa de opinião pública que entrevistou 1.650 pessoas entre novembro de 2020 e janeiro deste ano, em amostra representativa da população brasileira segundo suas principais características sociodemográficas. O ICJBrasil é realizado desde 2009, com coordenação de pesquisadores da UFSCar e da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e financiamento da FGV.
Nesta edição, além das questões mais gerais sobre a confiança da população no Poder Judiciário, a pesquisa teve perguntas específicas sobre o STF. "As perguntas buscam medir conhecimento, confiança e legitimidade. A confiança vem da avaliação de desempenho, depende da concordância ou discordância com as decisões tomadas. Já a legitimidade não tem relação direta com o comportamento da corte, e sim com percepção de valor da instituição, com expectativas normativas sobre as suas competências. A legitimidade depende, portanto, do conhecimento sobre essas competências, sobre o papel do STF na democracia brasileira", situa Fabiana Luci de Oliveira, docente do Departamento de Sociologia da UFSCar que é uma das coordenadoras do estudo.
O levantamento mostra que, embora a maior parte das pessoas já tenham ouvido falar do STF (80% dos respondentes), apenas 15% têm familiaridade com as suas competências. "Esse desconhecimento aumenta a fragilidade institucional da Corte, a susceptibilidade às críticas e, até mesmo, a ataques dos outros poderes e instituições", afirma Oliveira.
Das pessoas entrevistadas, 42% responderam que confiam no Supremo, percentual que era de 24% em 2017. Essa confiança, no entanto, varia conforme o apoio ao Presidente, sendo maior - 47% - entre os que não declararam voto em Jair Bolsonaro. "Se as pessoas conhecem pouco as competências do STF, acabam dependendo de terceiros para formar a sua opinião. E se o Presidente elegeu o Supremo como inimigo número 1 do governo, é esperado que seus apoiadores tenham adesão a essa visão também", explica a pesquisadora da UFSCar.
A distinção entre apoiadores e críticos aparece com ainda mais força na avaliação específica sobre ações da corte na pandemia. Das pessoas que disseram estar acompanhando as decisões do STF na pandemia (45% do total), 39% consideram a atuação do Supremo ótima ou boa, 35% regular e 25% ruim ou péssima. No entanto, entre eleitores declarados de Bolsonaro, 39% avaliam a atuação negativamente, percentual que cai para 18% entre aqueles que não declaram apoio ao Presidente.
"Na pandemia, o STF decidiu contra a maior parte das políticas do governo Bolsonaro que buscavam minimizar a gravidade deste momento, sobretudo ligadas às restrições sanitárias. Assim, por causa do teor dessas decisões, que têm colocado freios às políticas e posições negacionistas, a cisão entre eleitores e não eleitores fica mais explícita", analisa Oliveira.
Mesmo assim, oito em cada dez brasileiros acham que é injustificável o fechamento do STF pelo Presidente da República quando o País enfrenta dificuldades (76% dos respondentes, com índice de 63% entre eleitores de Bolsonaro).
"O percentual de 42% de confiança, que poderia parecer baixo, não pode ser lido separado desses 76%, dos 62% contrários à possibilidade de Bolsonaro afastar os ministros Alexandre de Moraes ou Luiz Roberto Barroso por discordar das decisões que eles têm tomado ou dos 58% que discordam que seja melhor fechar o Supremo caso ele decida sistematicamente contra os anseios da população", contextualiza a pesquisadora da UFSCar.
"Embora a confiança, ou seja, a avaliação do desempenho, seja baixa, a legitimidade é mais alta. Embora a população esteja descontente com as decisões, com o comportamento do STF em termos práticos, existe percepção do valor da Instituição e de sua importância para a existência da democracia", conclui Oliveira. "O STF dispõe de legitimidade e do apoio da maior parte da população para resistir aos ataques que o atual governo tem feito contra a democracia. É percebido pela maior parte da população que é fundamental a existência de um tribunal que possa colocar controles a esta escalada autoritária, autocrática. Ainda que não se conheça muito bem, que não se entenda muito bem as funções do Supremo, há uma percepção partilhada entre a maioria que o STF tem sim um papel e que ele não pode estar a mercê das arbitrariedades de qualquer um dos outros poderes, não pode estar a mercê das arbitrariedades do Presidente", acrescenta.
Os dados completos do ICJBrasil podem ser conferidos em relatório disponível no site da FGV, que tem como autores, além da pesquisadora da UFSCar, Luciana de Oliveira Ramos e Luciana Gross Cunha, ambas da Escola de Direito de São Paulo da FGV (FGV Direito SP), e de Joelson de Oliveira Sampaio, da Escola de Economia de São Paulo da FGV (FGV EESP). A entrevista com Fabiana Luci de Oliveira também pode ser conferida na edição desta sexta-feira do podcast "Ciência UFSCar", disponível nos principais tocadores de áudio e na área de podcasts do site da Rádio UFSCar.
Crédito da foto: Leandro Ciuffo, CC BY 2.0 , via Wikimedia Commons
É o que indica a edição mais recente do Índice de Confiança na Justiça no Brasil (ICJBrasil), pesquisa de opinião pública que entrevistou 1.650 pessoas entre novembro de 2020 e janeiro deste ano, em amostra representativa da população brasileira segundo suas principais características sociodemográficas. O ICJBrasil é realizado desde 2009, com coordenação de pesquisadores da UFSCar e da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e financiamento da FGV.
Nesta edição, além das questões mais gerais sobre a confiança da população no Poder Judiciário, a pesquisa teve perguntas específicas sobre o STF. "As perguntas buscam medir conhecimento, confiança e legitimidade. A confiança vem da avaliação de desempenho, depende da concordância ou discordância com as decisões tomadas. Já a legitimidade não tem relação direta com o comportamento da corte, e sim com percepção de valor da instituição, com expectativas normativas sobre as suas competências. A legitimidade depende, portanto, do conhecimento sobre essas competências, sobre o papel do STF na democracia brasileira", situa Fabiana Luci de Oliveira, docente do Departamento de Sociologia da UFSCar que é uma das coordenadoras do estudo.
O levantamento mostra que, embora a maior parte das pessoas já tenham ouvido falar do STF (80% dos respondentes), apenas 15% têm familiaridade com as suas competências. "Esse desconhecimento aumenta a fragilidade institucional da Corte, a susceptibilidade às críticas e, até mesmo, a ataques dos outros poderes e instituições", afirma Oliveira.
Das pessoas entrevistadas, 42% responderam que confiam no Supremo, percentual que era de 24% em 2017. Essa confiança, no entanto, varia conforme o apoio ao Presidente, sendo maior - 47% - entre os que não declararam voto em Jair Bolsonaro. "Se as pessoas conhecem pouco as competências do STF, acabam dependendo de terceiros para formar a sua opinião. E se o Presidente elegeu o Supremo como inimigo número 1 do governo, é esperado que seus apoiadores tenham adesão a essa visão também", explica a pesquisadora da UFSCar.
A distinção entre apoiadores e críticos aparece com ainda mais força na avaliação específica sobre ações da corte na pandemia. Das pessoas que disseram estar acompanhando as decisões do STF na pandemia (45% do total), 39% consideram a atuação do Supremo ótima ou boa, 35% regular e 25% ruim ou péssima. No entanto, entre eleitores declarados de Bolsonaro, 39% avaliam a atuação negativamente, percentual que cai para 18% entre aqueles que não declaram apoio ao Presidente.
"Na pandemia, o STF decidiu contra a maior parte das políticas do governo Bolsonaro que buscavam minimizar a gravidade deste momento, sobretudo ligadas às restrições sanitárias. Assim, por causa do teor dessas decisões, que têm colocado freios às políticas e posições negacionistas, a cisão entre eleitores e não eleitores fica mais explícita", analisa Oliveira.
Mesmo assim, oito em cada dez brasileiros acham que é injustificável o fechamento do STF pelo Presidente da República quando o País enfrenta dificuldades (76% dos respondentes, com índice de 63% entre eleitores de Bolsonaro).
"O percentual de 42% de confiança, que poderia parecer baixo, não pode ser lido separado desses 76%, dos 62% contrários à possibilidade de Bolsonaro afastar os ministros Alexandre de Moraes ou Luiz Roberto Barroso por discordar das decisões que eles têm tomado ou dos 58% que discordam que seja melhor fechar o Supremo caso ele decida sistematicamente contra os anseios da população", contextualiza a pesquisadora da UFSCar.
"Embora a confiança, ou seja, a avaliação do desempenho, seja baixa, a legitimidade é mais alta. Embora a população esteja descontente com as decisões, com o comportamento do STF em termos práticos, existe percepção do valor da Instituição e de sua importância para a existência da democracia", conclui Oliveira. "O STF dispõe de legitimidade e do apoio da maior parte da população para resistir aos ataques que o atual governo tem feito contra a democracia. É percebido pela maior parte da população que é fundamental a existência de um tribunal que possa colocar controles a esta escalada autoritária, autocrática. Ainda que não se conheça muito bem, que não se entenda muito bem as funções do Supremo, há uma percepção partilhada entre a maioria que o STF tem sim um papel e que ele não pode estar a mercê das arbitrariedades de qualquer um dos outros poderes, não pode estar a mercê das arbitrariedades do Presidente", acrescenta.
Os dados completos do ICJBrasil podem ser conferidos em relatório disponível no site da FGV, que tem como autores, além da pesquisadora da UFSCar, Luciana de Oliveira Ramos e Luciana Gross Cunha, ambas da Escola de Direito de São Paulo da FGV (FGV Direito SP), e de Joelson de Oliveira Sampaio, da Escola de Economia de São Paulo da FGV (FGV EESP). A entrevista com Fabiana Luci de Oliveira também pode ser conferida na edição desta sexta-feira do podcast "Ciência UFSCar", disponível nos principais tocadores de áudio e na área de podcasts do site da Rádio UFSCar.
Crédito da foto: Leandro Ciuffo, CC BY 2.0 , via Wikimedia Commons
03/09/2021
7:00:00
25/11/2021
23:59:00
Mariana Pezzo
Sim
Não
Estudante
Foto: Leandro Ciuffo, CC BY 2.0, via Wikimedia Commons
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