Ensino de Biologia da Conservação pode impactar Saúde Mental
Vinícius de Avelar São Pedro, professor no curso de Ciências Biológicas no Campus Lagoa do Sino da UFSCar, repara há algum tempo como estudantes chegam motivados às aulas de Biologia da Conservação, mas muitos saem desanimados, manifestando, por exemplo, dificuldade para dormir depois do que é conhecido como "disciplina da crise". A experiência de viver de perto a perda de uma aluna por problemas de Saúde Mental levou a preocupação do docente ao limite, e ao compromisso de fazer o que pudesse para evitar ocorrências futuras. "Para começar, era preciso repensar a sala de aula. Ela não é o único disparador, mas pode ser um fator importante no surgimento ou agravamento de problemas de Saúde Mental", avalia São Pedro.
Junto com os colegas docentes Larissa Trierveiler-Pereira e Juliano Marcon Baltazar, São Pedro assina artigo publicado em setembro no periódico PLOS Biology, sobre eco-ansiedade em estudantes de Biologia e adaptações possíveis no ensino de Biologia da Conservação. O trabalho é fruto de levantamento realizado junto a 250 estudantes de seis instituições públicas brasileiras, no qual 73% dos participantes qualificaram sua Saúde Mental como ruim ou péssima e 58% avaliaram que estudar os problemas ambientais piora esse quadro. Além disso, 86% disseram que a opinião de seus professores influencia suas perspectivas de futuro.
"Um dos motivos que me levou a refletir foi justamente o fato de ter me tornado um pouco mais pessimista na vida adulta. Temos muitos jovens que escolhem a Biologia pelo desejo de ajudar, de transformar, e percebi que poderíamos estar minando o que eles têm de mais importante, que é essa vontade de fazer acontecer", conta São Pedro.
O estudo, no entanto, mostrou que, apesar de todo o pessimismo, vários respondentes (37%) ainda se sentiam otimistas em relação à atuação na Biologia e a maioria (60%) se dizia entusiasmada com a possibilidade de buscar soluções para os problemas ambientais.
Desesperança
Eco-ansiedade, ou luto ambiental, são definidos no artigo, a partir da literatura recente sobre o tema, como apreensão por antecipar ameaças aos ecossistemas e luto pela perda ecológica, respectivamente. Apesar dos fenômenos psicológicos associados ainda não serem completamente claros, é crescente a pesquisa na área, segundo os autores.
Imagina-se, por exemplo, que a menção frequente de problemas ambientais como as mudanças climáticas, perda de biodiversidade, desmatamento e esgotamento de recursos naturais possa pintar um quadro de irreversibilidade da catástrofe e, assim, eliminar perspectivas e minar as esperanças de jovens estudantes.
Considerando, assim, que o ambiente acadêmico e os conteúdos e métodos do processo de ensino-aprendizagem podem afetar a Saúde Mental dos estudantes negativa ou positivamente, os docentes da UFSCar fazem algumas sugestões de adaptações no ensino de Biologia da Conservação. Dentre elas, estão a busca por evitar negatividade exagerada e usar, na abordagem de tópicos críticos, estratégias que equilibrem problemas e possibilidades de solução, destacando conquistas. Mais especificamente, os autores sugerem que exemplos positivos apareçam no fim da aula, para que os estudantes levem com eles uma mensagem positiva.
Outro conjunto de orientações destaca a relevância de ouvir os estudantes, criando oportunidades para que expressem suas opiniões e pensamentos, nas quais o docente pode ficar atento ao pessimismo extremo e falta de esperança recorrente, que podem indicar a necessidade de cuidado. As recomendações também abordam o perigo de sobrecarregar os estudantes com a responsabilidade pelo futuro da Humanidade, ao falar, por exemplo, que "o fardo da crise ambiental é todo de vocês". Em vez disso, a mensagem pode ser que "nós, profissionais da área ambiental, podemos ajudar a mudar esse cenário".
E até mesmo a Saúde Mental de professoras e professores aparece no artigo. Nas palavras finais, os autores recomendam que, em caso de falta de esperança e ansiedade do próprio docente, este avalie se não é o caso de ser substituído na disciplina ou, até mesmo, buscar ajuda em relação à sua própria saúde. "Esperança é um fator importante no engajamento ambiental entre jovens, e educadores têm um papel vital em ativar esse sentimento. Acreditamos que ser mais empático e cauteloso na sala de aula é um modo simples não apenas de ajudar a manter nossos estudantes saudáveis, mas também de garantir o entusiasmo necessário aos futuros protagonistas da Biologia da Conservação", registram.
A íntegra do artigo, em Inglês, pode ser conferida em PLOS Biology.