Artigo recupera as origens do local onde está o Campus Araras da UFSCar

Araras, São Carlos
Pesquisa investigou a história da Fazenda Santa Escolástica no século XIX
O professor Luiz Antonio Cabello Norder, do Departamento de Desenvolvimento Rural (DDR), e o estudante Gustavo de Andrade Poyares, do bacharelado em Agroecologia, ambos do Campus Araras da UFSCar, publicaram recentemente o artigo "História e patrimônio arquitetônico rural: a Fazenda Santa Escolástica em Araras, SP (1855-1888)", que trata das origens do Campus Araras da UFSCar, instalado nas antigas dependências da Fazenda Santa Escolástica.

"A ideia da pesquisa surgiu em 2019, durante a criação do Estúdio de Ensaios Musicais no Campus, justamente em uma das edificações remanescentes da antiga Fazenda Santa Escolástica. Não se sabia praticamente nada sobre a história dessa Fazenda, mas, na memória popular, havia uma vaga noção de que aquele espaço que estávamos ocupando havia sido uma senzala. A partir de então, passamos a procurar e analisar informações sobre a história da Fazenda no século XIX, levando em consideração que esse conhecimento é relevante para uma instituição de ensino com cursos na área das Ciências Agrárias", descreve Norder.  

De acordo com o pesquisador, foi possível constatar que, nas décadas de 1860 e 1870, os proprietários da Fazenda eram cunhados dos Barões de Araras e Arary e faziam parte, portanto, de uma família latifundiária extremamente poderosa naquela época. "Então, identificamos documentos que demonstram que os proprietários da Fazenda fizeram forte oposição à Lei do Ventre Livre, em 1871. Além disso, na década seguinte, a família, juntamente com outros fazendeiros em Araras, tentou protelar a abolição da escravatura. Em 1887, por exemplo, defenderam que a abolição deveria ocorrer apenas em 31 de dezembro de 1891", destaca ele.

A pesquisa foi realizada a partir da análise de escrituras, mapas, dados genealógicos, registros de batismos, jornais da época digitalizados pela Biblioteca Nacional e um relato gravado, além da observação das próprias edificações. Foram levantadas informações sobre o nascimento na Fazenda de 69 pessoas com mães escravizadas entre 1869 e 1888. A taxa de mortalidade infantil era de 53%. Também foi elaborado um diagrama sobre as relações de compadrio entre as pessoas escravizadas na Fazenda.

"Encontramos informações que demonstram que na Fazenda Santa Escolástica, e em Araras de uma forma geral, a abolição ocorreu com base na ação dos próprios trabalhadores escravizados, particularmente através de duas formas articuladas de resistência: a exigência de pagamento de salários e as evasões em massa. Os fazendeiros perderam o controle da situação e muitas fazendas ficaram abandonadas. Tais evasões não eram uma fuga, mas um ato deliberado de enfrentamento. Por esse motivo, nos primeiros meses de 1888, a escravidão entrou em colapso. Havia uma carência generalizada de mão-de-obra na região e muitos fazendeiros passaram a contratar os até então trabalhadores escravizados que abandonavam as fazendas", explica Norder.

A ocupação das edificações
As edificações da antiga Fazenda Santa Escolástica foram intensamente utilizadas a partir de 1954 pelo Instituto do Açucar e do Álcool (IAA) e, a partir de 1991, pela UFSCar.  "Apesar das modificações ocorridas nesse processo de ocupação, há relevantes remanescentes, como um casarão construído em taipa de pilão, provavelmente na década de 1840; parte do antigo terreiro de café; uma tulha e outros três barracões, além de algumas outras ruínas de difícil acesso. A pesquisa pode contribuir para a elaboração de uma nova política de preservação e valorização do patrimônio histórico-arquitetônico da UFSCar em Araras", afirma o professor.

Os resultados da pesquisa foram apresentados na programação da Agenda Unificada 2024 do Novembro Negro em Araras. Durante o evento, juntamente com representantes do Conselho Municipal de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra, da Comissão Municipal de Religiões de Matriz Africana e outras organizações do movimento negro local, foi elaborada uma proposta de criação de um Memorial do Protagonismo Negro na Abolição no Campus Araras da UFSCar. "Essa proposta, em fase de elaboração, tem o objetivo de inserir as edificações da antiga fazenda no roteiro do turismo afrocentrado do Estado de São Paulo, visando ressaltar a contribuição efetiva e decisiva da população negra para a conquista civilizatória representada pela abolição da escravatura", conclui Norder.

O artigo foi publicado na Revista Labor e Engenho da Unicamp e está disponível neste link.
23/01/2025
13:00:00
08/02/2025
23:59:00
João Eduardo Justi
Sim
Não
Estudante, Docente/TA, Pesquisador, Visitante
Pesquisa investigou a história da Fazenda Santa Escolástica no século XIX (Foto: Acervo/CCS)
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