Projeto da UFSCar para a área da saúde está em risco

São Carlos
"A decisão de criar o curso de Medicina na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), tomada pela comunidade universitária em 2005, significou a consolidação de um projeto institucional para toda a área da Saúde na Instituição. Tal projeto está pautado na formação de profissionais comprometidos com a Saúde Pública em nosso país e na qualificação do Sistema Único de Saúde (SUS), com consequente aprimoramento dos serviços oferecidos à população. Esse modelo está em consonância com os princípios do SUS – universalidade, equidade e integralidade – e com as diretrizes para a formação profissional em Saúde dos ministérios da Saúde e da Educação, tendo, inclusive, colocado a UFSCar em posição de destaque e referência na área. Essa decisão por um projeto inovador, fundado na relação estreita entre a Universidade e o poder público municipal, trouxe inúmeros desafios e conquistas, como a consolidação da Rede Escola de Cuidados à Saúde de São Carlos e a instituição do Conselho de Parceria entre a Universidade e a Prefeitura Municipal de São Carlos, responsável pela formulação e acompanhamento da política de formação profissional e de cuidados em Saúde, pela integração das ações de ambos os parceiros e pela proposição de instrumentos legais voltados à institucionalização dessas políticas e à sua sedimentação enquanto políticas de Estado. No entanto, não obstante todos os esforços empreendidos e conquistas obtidas, este projeto encontra-se, atualmente, em risco, motivo pelo qual nos dirigimos neste momento à comunidade universitária, com o objetivo de compartilhar nossas preocupações e envolvê-la na defesa de uma política que é fruto de uma decisão coletiva desta comunidade. Ainda em 2012, logo após a realização das eleições municipais, a Administração Superior da Universidade entrou em contato com o Prefeito eleito para apresentação deste projeto e início do diálogo visando sua continuidade. Apenas no mês de dezembro foi possível realizar uma primeira reunião, ocasião em que ouvimos haver total consonância entre a política defendida pela Universidade e as intenções do futuro governo municipal. No entanto, a partir de janeiro, inúmeras foram as dificuldades encontradas para que pudéssemos dar continuidade ao diálogo então iniciado, visando debater especialmente duas pautas: as atividades de preceptoria – ou seja, de acompanhamento dos estudantes do curso de Medicina – por parte dos médicos do Município e a possibilidade de transformar o Hospital Escola Municipal em um hospital efetivamente universitário, por meio de sua federalização. Em relação à preceptoria, a dificuldade encontrada dizia respeito, inicialmente, à autorização do novo governo municipal para que os médicos, quando em atividade de preceptoria, reduzissem o número de consultas diárias de 12 para 8, como já acontecia no período anterior. Essa necessidade havia sido apresentada ao então Secretário Municipal de Saúde já no dia 9 de janeiro, visando permitir o equacionamento da questão até o dia 18 de fevereiro, data para a qual estava previsto o início das atividades dos estudantes na rede pública de Saúde do Município em 2013. No entanto, apesar de insistentes tentativas de contato por parte da Coordenação do Curso de Medicina e da Administração Superior da Universidade, apenas na segunda semana de fevereiro a Secretaria de Saúde voltou a receber representantes da UFSCar para apresentação da proposta de contrato de preceptoria. Após novo período de silêncio por parte do governo municipal, os estudantes de Medicina entraram em greve no dia 15 de março, frente à impossibilidade de realização das atividades previstas para os 1º, 2º, 3º e 4º anos nos equipamentos de Saúde do Município. A pauta dos estudantes incluía alguns pontos internos à Universidade, aos quais foi dado pronto encaminhamento, envolvendo grandes esforços de toda a Administração Superior, da Diretoria do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde, da Chefia do Departamento de Medicina e da Coordenação do Curso de Medicina. No entanto, em relação à preceptoria, apenas nos dias 4 e 5 de abril a Secretaria de Saúde compareceu a audiências na Universidade – após realização de manifestação dos estudantes de Medicina em greve no Paço Municipal –, quando manifestou sua concordância com a redução no número de consultas, condicionando-a à aprovação de algumas matérias na Câmara Municipal e comprometendo-se a enviar as documentações necessárias à Câmara até a próxima sessão daquela casa, prevista para o dia 9 de abril. Mais uma vez seguiu-se um longo silêncio da Prefeitura Municipal, apesar de inúmeras solicitações de audiência por parte da Reitoria da UFSCar e, posteriormente, de comissão do Conselho Universitário nomeada com o objetivo de representar a Universidade em seu diálogo com a Prefeitura visando o equacionamento das questões referentes à área da Saúde. Apenas no dia 29 de abril os documentos foram finalmente enviados pela Prefeitura à Câmara Municipal (novamente após manifestações dos estudantes junto à Câmara, que levaram a Prefeitura a recebê-los em reunião que contou com a presença de vereadores), tendo sido apreciados e aprovados em sessões realizadas nos dias 30 de abril e 14 de maio. Desde então, a Universidade vem empreendendo todos os esforços possíveis junto aos médicos do Município – inclusive reunião na Sociedade Médica de São Carlos – visando atingir o número de preceptores necessários ao acompanhamento dos estudantes do curso de Medicina. Paralelamente, a Pró-Reitoria de Graduação, em diálogo com a Coordenação de Curso e a Chefia do Departamento de Medicina, conseguiu estabelecer um calendário alternativo que já permitiu a retomada das atividades dos 1º e 2º anos e, na próxima semana, dos 3º e 4º anos. Os 5º e 6º anos não interromperam as atividades de internato, que está sendo realizado no município de Piracicaba, uma vez que a Santa Casa de São Carlos apresentou à Universidade valores muito mais elevados que outros hospitais, o que tornaria sua contratação injustificável. Paralelamente às ações relacionadas à viabilização das preceptorias, a Administração Superior da UFSCar também vem tentando, desde o final de fevereiro, iniciar diálogo com a Prefeitura Municipal com o objetivo de apresentar a proposta de federalização do Hospital Escola e de sua gestão pela Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) como alternativa tanto para a manutenção e financiamento do Hospital em seu funcionamento pleno quanto para que os estudantes dos cursos de Saúde da Universidade possam ter garantidos cenários de aprendizagem em São Carlos. No entanto, também neste caso as inúmeras solicitações de audiência enviadas ao Prefeito Municipal foram sumariamente ignoradas. O primeiro passo da Administração Superior no que diz respeito à possibilidade de federalização do Hospital foi dado no dia 28 de fevereiro, quando o Conselho Universitário autorizou a Reitoria a empreender as negociações necessárias à deliberação sobre a transformação do Hospital Escola em hospital universitário. Imediatamente, a Administração Superior iniciou as tentativas de contato com os ministérios da Educação e da Saúde e com a Prefeitura Municipal, sendo que os órgãos do Governo Federal já indicaram o seu apoio à proposta. No entanto, sua efetivação depende da Prefeitura optar pela doação do Hospital à UFSCar. É importante informar que a consulta da Reitoria ao Conselho Universitário partiu da constatação, ao longo do processo de construção da Rede Escola de Cuidados à Saúde, da relevância da Universidade ser responsável pela gestão clínica do Hospital, bem como de manifestações favoráveis à federalização por parte da Direção do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde e do Conselho de Parceria, feitas ainda em 2012. Em janeiro deste ano, a Associação de Prefeitos da Região Central do Estado de São Paulo (Aprec) também publicou manifesto em defesa da federalização, resultante de reunião que contou com a participação de representantes da Prefeitura Municipal de São Carlos. Porém, além de não responder às solicitações de audiência sobre o tema protocoladas pela Administração da Universidade, o Prefeito Municipal de São Carlos tem se manifestado publicamente como sendo contrário à federalização e, o que é mais grave, deixou de repassar à Sahudes (Sociedade de Apoio, Humanização e Desenvolvimento de Serviços de Saúde), organização responsável pela gestão do Hospital, os cerca de R$ 400 mil mensais que são, por contrato, responsabilidade da Prefeitura, o que resulta, até o momento, em uma dívida de mais de R$ 1,5 milhão. A Prefeitura alega estar condicionando o repasse à aprovação de contas do Hospital, o que não se justifica, uma vez que as contas já foram devidamente aprovadas por Comissão Municipal de Avaliação do Hospital Escola composta por representantes da Prefeitura, da Câmara de Vereadores, da própria Sahudes, do Conselho Municipal de Saúde e da sociedade civil. No dia 4 de junho, por intermédio do Deputado Federal Newton Lima, a Reitoria da UFSCar reuniu-se com o Ministro da Saúde, Alexandre Padilha, que, informado da situação, se comprometeu a apreciar a possibilidade de ampliação do repasse financeiro que cabe ao Ministério dos atuais R$ 700 mil mensais para cerca de R$ 1,2 milhão. No entanto, tal medida depende de solicitação formal da Prefeitura, gestora plena do SUS em São Carlos, o que não aconteceu até o momento, apesar de novo ofício encaminhado pela Reitoria com informes sobre a reunião realizada. Outro ponto a ser esclarecido diz respeito à intenção expressa pelo Prefeito Municipal de instalar um Ambulatório Médico de Especialidades (AME) nas atuais dependências do Hospital Escola. Inicialmente, tomamos ciência dessa intenção apenas pela imprensa. No dia 7 de junho, recebemos na Reitoria o Deputado Estadual Roberto Massafera, por solicitação do próprio Deputado, que veio acompanhado do Procurador Geral do município de São Carlos, Waldomiro Antônio Bueno de Oliveira, ocasião em que tal intenção nos foi oficialmente informada. No encontro, além de debater a possibilidade de federalização do Hospital Escola e de solicitar intervenção de Massafera e Oliveira junto ao Prefeito Municipal para equacionamento do impasse referente aos recursos financeiros devidos, pudemos, de um lado, expressar nosso apoio à instalação do AME no Município e, de outro, apresentar os argumentos técnicos que subsidiam nossa proposta de que seja instalado em espaço contíguo ao Hospital Escola, e não nas atuais dependências do Hospital. Tais argumentos estão relacionados ao fato de que o projeto do Hospital foi elaborado para que este possa, com a inauguração do seu segundo módulo, configurar-se enquanto centro de alta complexidade e, por isso mesmo, altamente resolutivo (já que, à unidade de pronto-atendimento, serão acrescidos UTI, centro cirúrgico, centro de diagnóstico laboratorial, unidade de anatomia patológica e enfermarias). A instalação do AME nas dependências do Hospital não só impedirá essa configuração, mas também ampliará a demanda por serviços de alta complexidade no Município, já que o AME destina-se justamente à realização de diagnósticos precisos com agilidade e ao encaminhamento dos casos que necessitarem cuidados adicionais à rede de Saúde do Município – que, neste momento, não consegue absorvê-los e, com o Hospital Escola em pleno funcionamento, teria mais do que dobrada a sua capacidade atual. A consequência de toda a situação aqui relatada é que a Prefeitura Municipal está estrangulando financeiramente a gestão do Hospital Escola que, impossibilitado de pagar seus funcionários e, principalmente, de adquirir os insumos hospitalares essenciais à oferta de assistência aos usuários da unidade, deverá paralisar suas atividades nos próximos dias. Considerando a gravidade desse cenário – com impactos óbvios sobre o atendimento em Saúde prestado à população de São Carlos e, também, sobre a manutenção dos cursos de Saúde da UFSCar, especialmente o de Medicina –, será realizada nesta sexta-feira (28 de junho) reunião do Conselho Universitário que terá na pauta a discussão sobre os obstáculos colocados à continuidade da Rede Escola de Cuidados à Saúde de São Carlos e as possibilidades de encaminhamento no que diz respeito à defesa do projeto da Universidade para a área da Saúde. Outras instâncias em que a questão está colocada são o Conselho Administrativo da Sahudes, a Comissão de Saúde da Câmara dos Vereadores de São Carlos e o Conselho Municipal de Saúde. Esperamos, com essa mobilização, finalmente sensibilizar a Prefeitura Municipal de São Carlos sobre a relevância desta que é uma política de Estado que deve estar além de eventuais disputas partidárias e, com isso, poder garantir a continuidade não apenas do funcionamento do Hospital Escola, mas de toda a Rede Escola de Cuidados em Saúde que, reiteramos, encontra-se em risco extremo neste momento, demandando providências urgentes. São Carlos, 24 de junho de 2013. Prof. Dr. Targino de Araújo Filho Reitor da UFSCar"
24/06/2013
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Mariana Pezzo
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