Pesquisadores da UFSCar realizam projetos voltados à agricultura familiar que beneficiam produtores

Lagoa do Sino
Grupo de Pesquisas em Espécies Hortícolas e Paisagismo busca entender as dificuldades de produtores locais e desenvolver soluções sustentáveis
A agricultura familiar é hoje a principal responsável pela produção de alimentos no Brasil. De acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), ela responde por cerca de 70% dos alimentos consumidos no País e possui papel decisivo na cadeia produtiva que abastece esse mercado. Embora tenha participação fundamental no plantio de alimentos, este modo de produção – que consiste no cultivo da terra realizado por pequenos produtores rurais que têm como base a mão de obra familiar – enfrenta desafios diários para manter plantações saudáveis, longe de pragas e problemas ambientais.

Com o intuito de amenizar estas dificuldades e auxiliar pequenos produtores, o Centro de Ciências Agrárias (CCA) do Campus Araras da UFSCar criou o Grupo de Pesquisas em Espécies Hortícolas e Paisagismo (GPHP), que é coordenado pelo professor Jean Carlos Cardoso, do Departamento de Desenvolvimento Rural (DDR). O grupo, atualmente composto por 23 alunos da UFSCar, realiza estudos voltados à agricultura de base sustentável, incluindo diferentes aspectos da produção hortícola – como floricultura, fruticultura, produção de hortaliças e plantas medicinais. Seu objetivo é aproximar os problemas reais dos produtores com soluções que possam ser colocadas como alternativas à produção. A ideia é, portanto, trazer benefícios aos produtores e alternativas ao meio ambiente. “Visamos desenvolver práticas e metodologias menos dependentes dos agrotóxicos e de fertilizantes de origem mineral, substituindo essas fontes de recursos por outras menos agressivas ao meio ambiente e aos trabalhadores que se utilizam dessas técnicas”, explica o docente Jean.

As pesquisas com foco na agricultura de base ecológica, que incluem o desenvolvimento de cultivares, podem beneficiar os pequenos produtores, como explica o professor: “O objetivo da produção própria de cultivares é atender ao produtor, que não dispõe de muitos recursos financeiros para gasto com fertilizantes de origem mineral e agrotóxicos, e também aqueles mais preocupados em mudar seu sistema de produção, utilizando fontes renováveis para substituição dessas fontes como forma de agregar valor ao seu produto”. Pretende-se, também, produzir um alimento de melhor qualidade para o cliente. “Nesse sentido, temos trabalhado com cultivares de tomate, abóboras, pimentas, goiabeiras, entre outras espécies de interesse para os produtores familiares”, conta Jean.

Além disso, outro trabalho desenvolvido pelo grupo engloba o desenvolvimento de insumos alternativos, que utiliza resíduos – como a poda de grama, esterco de animais e resíduos de alimentos – como alternativa de fertilizante na produção. “Esses resíduos são de alto valor nutricional no cultivo de plantas, sendo os resultados obtidos até o momento bastante surpreendentes e promissores. A prévia compostagem desses resíduos tem se mostrado uma alternativa eficiente para disponibilizar nutrientes, tornando-os disponíveis as plantas”, ressalta.

O caminho até o produtor rural
A maior parte destas pesquisas aplicadas é realizada dentro do Campus Araras da UFSCar. Após estudos e análises, o grupo realiza um esforço para que essas tecnologias cheguem diretamente ao produtor. Além de promover uma ampla divulgação científica – seja por meio da produção de notícias pelos veículos de comunicação da UFSCar, por meio de mídias televisivas ou mesmo pela divulgação de trabalhos científicos –, há também o estabelecimento de parceria com produtores e empresas. “Acredito nessa proposta de trabalho direto com os agricultores familiares, pois são pessoas com muitas qualidades, motivação, empenho, dedicação, simplicidade e que, acima de tudo, sonham com maior valorização de seu trabalho. Atualmente, mesmo a agricultura familiar alimentando basicamente todas as famílias das cidades, ela ainda é pouco valorizada do ponto de vista econômico”, afirma Jean.

Segundo o docente, estima-se que apenas de 20 a 25% do todo o valor que se paga por uma hortaliça ou fruto fique na propriedade rural, sendo que de 75 a 80% do valor final pago pelo consumidor se resume aos processos antigos de comercialização, que envolvem vários intermediários, perdas pós-colheita e impostos. “Associado a isso, o processo de assistência ao produtor familiar teve uma perda de qualidade intensa nos últimos 20 anos, em especial pelo enfraquecimento e burocratização das empresas de assistência técnica rural municipais e estaduais. O trabalho que fazemos é uma forma de retomar essa força que a agricultura transborda, tanto de conhecimento, da juventude universitária e de ações honestas e justas com todos os membros da sociedade. Temos investido nessa direção e esperamos continuar fortalecendo esse contato direto”, prevê.

Nesse sentido, o grupo também realiza atendimento direto ao produtor por meio de reuniões para avaliação dos problemas e posterior discussão de soluções na propriedade rural. “Os estudantes entendem os principais problemas e depois geram alternativas possíveis de serem aplicadas em propriedades rurais, ação que gera benefícios mútuos, pois produz conhecimento, incentivando cada vez mais a capacitação desses futuros profissionais, e traz soluções para os produtores”, esclarece o docente. Um grande diferencial do grupo de pesquisa da UFSCar é que, mais do que realizar uma análise técnica dos problemas, ele trabalha primeiro com anseios e dificuldades, pontuando por prioridade seus problemas e relatos antes de fazer o diagnóstico da propriedade rural. “É comum entre os técnicos entrar na produção e avaliarem as plantas diretamente, mas percebemos que essa é uma visão muito desumana do processo e que desconsidera o conhecimento e a vivência do próprio produtor rural. Agindo de modo distinto, conseguimos trabalhar os problemas por prioridades, resolvendo aqueles de maior impacto e depois tratando daqueles menos prioritários”, explica Jean. Também há processos em que os produtores rurais pagam bolsas de iniciação à pesquisa e desenvolvimento tecnológico ou de estágio, o que traz retorno de valor para o estudante, pois seu trabalho passa a ser mais valorizado. O docente conta que alguns trabalhos também são financiados com recursos da Pró-Reitoria de Extensão (ProEx) da Universidade, motivando a comunidade acadêmica a dar andamento nos projetos.

O estudante Douglas Couto, aluno do curso de Engenharia Agronômica do Campus Araras da UFSCar, é também participante do Grupo de Pesquisas em Horticultura e Paisagismo e um produtor. “Trabalho diretamente com produtores há 10 anos, mas há três faço parte formalmente da diretoria de uma associação de produtores rurais em meu bairro. Minhas atividades envolvem o auxílio na parte de adubação, fertilização, produção e compactação do solo”, descreve. Segundo o aluno, a equipe gestora da associação se reúne mensalmente para debater os problemas relacionados a pragas e doenças em plantações de pequenos produtores. “Discutimos também onde está os insumos de menor valor e o que se pode ou não aplicar nas plantações. Levo as dúvidas recorrentes ao Grupo de Pesquisa e assim conseguimos ampliar o conhecimento”, ressalta.

Douglas conta que sempre teve vontade de trabalhar com pequenos produtores, já que seus familiares pertencem à zona rural. “Me identifiquei ainda mais com a área depois que passei a ser aluno da UFSCar. Trabalhar com produtores rurais é algo fascinante, pois são pessoas que gostam de conversar e de contar o que vêm acumulando de épocas em plantio. Tenho a oportunidade de transmitir o conhecimento que adquiro na Universidade com eles e aplicá-lo na prática, o que é incrível. Além disso, há uma troca muito benéfica, pois nós, alunos, aprendemos mais do que ensinamos a eles, porque cada região tem um tipo de plantio e de produção”, conta.

Na opinião do aluno, a parceria da Universidade com os produtores rurais de Araras e região auxilia no crescimento da renda familiar e a diminuir o êxodo rural. “O intuito é justamente aumentar as opções de assistência aos produtores. Sendo aluno da UFSCar, acredito que a minha contribuição com os trabalhadores surge para compensar o que eu tenho adquirido aqui: uma universidade gratuita e de qualidade. Pretendo continuar repassando o meu conhecimento de forma gratuita aos pequenos produtores do bairro onde eu moro e dar continuidade às pesquisas na área para tentar melhorar a produção e aumentar a renda mensal dessas pessoas”, afirma Douglas.

Jessica Foschini, aluna de mestrado no Programa de Pós-Graduação em Produção Vegetal e Bioprocessos Associados (PPGPVBA) da UFSCar, foi também aluna do curso de Bacharelado em Agroecologia na Universidade, momento em que iniciou o contato com produtores rurais e que mantém até hoje, já que trabalha em uma empresa localizada em Holambra (SP) que possui uma parceria com a UFSCar no intuito de auxiliar esses trabalhadores. A estudante acredita que parcerias bem feitas entre universidade e empresa são capazes de suprir necessidades dos produtores. “Enquanto as universidades passam a conhecer, na prática, os problemas enfrentados pelo produtor rural e por empresas do setor agrário para capacitar seus alunos, o mercado de trabalho depende do conhecimento acadêmico, das pesquisas e da formação de bons profissionais para solucionar problemas em sua produção e alavancar os negócios”, afirma.

Segundo Jean, projetos de pesquisa e extensão conjuntos como este são essenciais para a geração de conhecimento na Universidade e para o auxílio ao desenvolvimento na economia do País. “Acredito que o envolvimento de professores e estudantes com os produtores no processo de produção pode ser uma oportunidade de geração de conhecimento. É importante que os estudantes estejam aptos a realizarem um trabalho que demonstre compromisso e que sua experiência com o produtor não seja somente pós-universidade, mas sim dentro dela, fortalecendo todos os lados da sustentabilidade. Ao mesmo tempo, é uma forma de mostrar que a UFSCar, por se preocupar constantemente com as ações de desenvolvimento regional, atua diretamente com os produtores que estão ao seu redor, mas sem se esquecer do impacto mundial que a pesquisa e a geração do conhecimento devem resultar nos dias atuais”, finaliza o docente.

Legenda: Estudantes do GPHP montam experimento com hortaliças em canteiros de cultivo. Foto: Divulgação
09/05/2016
13:00:00
16/05/2016
0:01:00
Adriana Arruda
Sim
Não
Estudante, Docente/TA, Pesquisador, Visitante
Estudantes do GPHP montam experimento com hortaliças em canteiros de cultivo. Foto: Divulgação
8515