Diminuição de animais com dieta específica agrava crise ambiental

Sorocaba, São Carlos
Estudo da UFSCar mostra que desaparecimento de espécies têm sido uma das maiores ameaças para a biodiversidade no Brasil
As espécies animais com dietas específicas exercem diferentes funções em um ecossistema. Quando alguma dessas espécies desaparece ou tem suas populações reduzidas, as relações ecológicas ficam comprometidas. Com base nisso, o pesquisador da UFSCar, Augusto Piratelli, faz um alerta: "A perda das relações ecológicas envolvendo espécies animais frugívoras, nectarívoras e insetívoras têm sido uma das maiores ameaças para a biodiversidade no Brasil".

Segundo ele, o desaparecimento de espécies frugívoras - que se alimentam de frutas - compromete a dispersão das sementes; sem nectarívoras, como as abelhas, há menos polinização, o que pode afetar a produção agrícola. O declínio das insetívoras, por sua vez, reduz o controle de doenças e pragas agrícolas por causar o aumento de insetos como lagartas, pernilongos e moscas. "Há que se mencionar também os urubus, que removem carcaças e colaboram reduzindo transmissão de doenças e contaminação ambiental; e cujo desaparecimento, portanto, pode ser bastante problemático", afirma Piratelli, docente do Departamento de Ciências Ambientais (DCA) do Campus Sorocaba da Universidade.

A perda dessas espécies, segundo ele, está associada à contaminação ambiental e à fragmentação e redução da vegetação nativa. Os desmatamentos, por exemplo, diminuem o sequestro de carbono e põem em risco a proteção do solo e o controle climático. "Isso tudo, associado à introdução de espécies exóticas e ao comércio ilegal de animais, tem colocado inúmeras espécies em risco de extinção", alerta Piratelli. 

As pesquisas pertencem à chamada ecologia trófica. "É o estudo das interações às quais chamamos predador-presa, ou top-down; analisamos as relações entre os animais em seus diferentes nichos tróficos, focando na dieta  - por exemplo, o tipo de presa - e o modo como eles buscam esse alimento, como caçar insetos em voo", ilustra o professor. "Por meio desses estudos, conseguimos classificar as aves em guildas tróficas, que são grupos com semelhantes dietas e modos de forrageio (caça). Isso auxilia no diagnóstico do estado atual de conservação de uma área", afirma ele. "Por exemplo, podemos supor que uma mata onde predominam aves generalistas (aquelas que têm uma dieta muito ampla) pode estar mais degradada do que outra onde há muitos insetívoros de tronco - aqueles que se alimentam percorrendo troncos de árvores, como pica-paus e arapaçus", completa o docente.

Em seu trabalho, Piratelli relaciona espécies de aves a diferentes tipos de áreas - florestais, agrícola e urbanas - na região das cidades de Sorocaba e São Paulo. Entre as áreas estudadas pelo professor da UFSCar - todas localizadas no Estado de São Paulo - estão: o Parque Estadual Carlos Botelho, na cidade de São Miguel Arcanjo; a Floresta Nacional de Ipanema, em Iperó; áreas agrícolas nos municípios de Piedade e Pilar do Sul; fragmentos florestais em Itu, Sorocaba e Araçoiaba da Serra; e centros urbanos em Sorocaba e São Paulo. "O padrão mais comum é uma simplificação e homogeneização da biodiversidade conforme caminhamos da floresta contínua paras as cidades. Perdemos espécies com maiores exigências ecológicas, que são gradativamente substituídas por generalistas e oportunistas. As espécies que vivem nas cidades são aquelas que conseguem se adequar ao ambiente extremamente modificado pelo homem, comendo por exemplo restos de alimentos e fazendo ninhos em construções e artefatos humanos", compara Piratelli.

Segundo o professor, a abordagem de ecologia trófica e serviços ecossistêmicos é relativamente nova no Brasil e a ecologia urbana também tem recebido mais atenção somente mais recentemente, assim como a avifauna em sistema agrícolas: "Costumamos estudar em nível de comunidades e suas relações tróficas. Ou seja, estudamos o grupo das aves presentes em uma região e, por meio delas, diagnosticamos as características ambientais. Também buscamos detectar quais os fatores do ambiente, locais e regionais, influenciam na diversidade de aves. Com isso, podemos sugerir as melhores práticas para resgate da fauna e maior equilíbrio ambiental", detalha o pesquisador.

Os resultados - sobre os efeitos da fragmentação, da atividade agrícola, da urbanização e das práticas de restauração nas comunidades de aves -  foram relatados e apresentados em vários trabalhos de conclusão de curso, dissertações de mestrado e teses de doutorado, além de diversos artigos publicados em revistas científicas orientados ou organizados por Piratelli. A equipe de pesquisa é formada principalmente por alunos de graduação, mestrado e doutorado. "Mais recentemente temos buscado parceria em outras instituições, como a Unicamp, USP e Unesp para aprofundarmos os trabalhos na área", conclui o professor.
08/06/2017
13:00:00
25/06/2017
23:59:00
Denise Britto
Não
Não
Estudante, Docente/TA, Pesquisador, Visitante
Estudo das aves auxilia no diagnóstico do estado de conservação de áreas. Foto: Augusto Piratelli
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